Houve quem “parabenizasse a natureza” pelo aparecimento do coronavírus, e nada é mais inoportuno (para não dizer desumano) do que uma atitude como essa. Tanto por demonstrar insensibilidade com as mortes que a covid-19 vem causando (já basta a indiferença de quem hoje nos governa), quanto pela falácia do argumento apresentado. A atual pandemia não veio demonstrar que é imprescindível fortalecer o papel do Estado para evitar a recorrência de tragédias semelhantes. A quantidade de mortes que o Leviatã estatal já provocou, em regimes totalitários, é muito superior à que se deve ao coronavírus. Nada impede que em países capitalistas o Estado se comprometa com a assistência à saúde dos menos favorecidos. O importante é que ele se compenetre do seu papel, deixando de servir aos maus políticos e aos empresários inescrupulosos. A cumplicidade entre esses dois grupos, que alimenta a corrupção, é pior para a saúde do País do que o mais letal dos vírus. Se o coronavírus ganha terreno (e multiplica as covas), é porque se vêm priorizando as disputas políticas em detrimento da vida das pessoas.
Notas sobre a pandemia (23)

Publicado por Chico Viana
Chico Viana (Francisco José Gomes Correia) é professor aposentado da UFPB e doutor em Teoria da Literatura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Em sua tese, publicada com o título de O evangelho da podridão; culpa e melancolia em Augusto dos Anjos, aborda a obra do paraibano com o apoio da psicanálise. Orientou cerca de 37 trabalhos acadêmicos, entre iniciação científica, mestrado e doutorado, e foi por dez anos pesquisador do Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq). Desde muito jovem começou a escrever nos jornais de João Pessoa, havendo mantido coluna semanal em A União e O Norte. Publicou cinco livros de crônicas. Ver mais posts